Projeto


Estrutura é um termo que caracteriza tanto o conjunto quanto componentes de construção civil, unidades de processo e equipamentos mecânicos que estejam submetidos a tensões de trabalho potencialmente capazes de provocar suas falhas.

Integridade Estrutural é o nome do conjunto de ciências, tecnologias e técnicas multidisciplinares necessárias à previsão da vida útil de estruturas. A avaliação da integridade estrutural resulta da aplicação de métodos que procuram estabelecer o dano acumulado na estrutura e sua respectiva taxa de crescimento, com o objetivo de evitar falhas, prever a vida residual e programar ações de extensão da vida útil

Embora no Brasil a geração termoelétrica seja considerada complementar em uma matriz de geração preponderantemente hídrica, a operação continuada das usinas termoelétricas faz com que a extensão da vida útil de seus sistemas, equipamentos e componentes se torne estratégica no processo da expansão social e industrial do país. Portanto, uma exigência atual das áreas de geração e transmissão de energia em plantas termoelétricas é a implantação de uma política economicamente viável que permita ações de extensão da vida útil.

Fadiga é considerada a falha mecânica mais recorrente da Engenharia e resulta do desenvolvimento progressivo de trincas sob a ação de carregamentos cíclicos. Sendo assim, devido a extrema relevância de danos por fadiga na previsão e controle de falhas, uma boa parte de pesquisas e recursos financeiros, a nível mundial, tem sido destinados para avaliações e previsões do comportamento de materiais sob condições cíclicas de carregamento.

Em função do desenvolvimento tecnológico, a vida-fadiga de inúmeros componentes mecânicos e estruturais pode ultrapassar a fronteira da fadiga de alto ciclo, estabelecida convencionalmente em 107 ciclos de carregamento. Com isto, a avaliação do comportamento em fadiga de longa duração (107 – 1012 ciclos) se torna extremamente importante, criando o conceito de fadiga de altíssimo ciclo (very high cycle fatigue).

Exemplos de componentes que sofrem fadiga de altíssimo ciclo são encontrados nas indústrias automotiva, ferroviária e aeroespacial, que desenvolvem projetos associando longas vidas em serviço com operações em altas velocidades. Neste contexto, ensaios de fadiga até 1012 ciclos de carregamento são fundamentais no desenvolvimento de materiais de pás de turbinas, peças rotativas (virabrequins e eixos) de alta velocidade para automóveis e outros veículos, bem como rolamentos. De maneira genérica, para todo componente cuja expectativa de vida em serviço ultrapasse 107 ciclos.


Vida-fadiga em regimes de serviço de longa duração


Embora se saiba da importância da avaliação do comportamento em fadiga de materiais, componentes e estruturas em regimes de serviço de longa duração, os critérios usuais de projeto são desenvolvidos com base em uma vida-fadiga de 106 – 107 ciclos, muito abaixo dos 109 – 1012 ciclos alcançados por componentes que experimentam uma longa ou super longa vida em fadiga.

A fadiga de altíssimo ciclo estabeleceu que uma tensão limite de fadiga (endurance limit) não existe em muitos casos (Figura 1). Nos materiais ferrosos, por exemplo, se considera a existência de vida infinita quando agem tensões cíclicas abaixo do limite de fadiga. Porém, pesquisas apontam para falhas de ligas ferrosas em até 109 ciclos de carregamento, resultado da iniciação de trincas subsuperficiais ou internas, relacionadas com defeitos locais nos materiais (Figura 2), o que significa que um projeto seguro em fadiga, baseado no critério da vida infinita do material, pode se tornar inadequado em certos casos. Alguns materiais exibem um limite de fadiga que decresce continuamente após 106 – 109 ciclos, fazendo com que sua resistência à fadiga num determinado número de ciclos seja mais importante do que o seu próprio limite de fadiga.

Por outro lado, ensaios convencionais de fadiga acima de 107 ciclos de carregamento são muitíssimos demorados, o que desestimula sua realização. A disponibilização de tecnologias ultrassônicas para ensaios de fadiga, baseadas em princípios físicos de ressonância e que permite testes com frequências de até 20 kHz (Figura 3), reduziu de maneira considerável o tempo do teste, fazendo com que 109 e 1010 ciclos sejam alcançados em 14 horas e 6 dias, respectivamente. Por outro lado, em ensaios com frequências de 300 Hz, 109 e 1010 ciclos são atingidos em 4 meses e 3 anos, respectivamente.

Projeto Eneva– PUC Rio e pesquisas em materiais

Sob escopo do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico do Setor de Energia Elétrica da ANEEL, o projeto Saúde Estrutural de Virabrequins de Indústrias Termoelétricas, celebrado entre Eneva e PUC-Rio em 2017, viabilizou a aquisição de máquina de ensaios de fadiga de altíssima frequência da marca Shimadzu, com atuador ultrassônico de 20 kHz, que permitirá testes até 1012 ciclos de carregamento. Através deste projeto, a Eneva proporcionou ao Departamento de Engenharia Química e de Materiais da PUC-Rio uma infraestrutura de pesquisa pioneira no país e na América do Sul, enquanto que a Shimadzu do Brasil tornou possível sua concretização, com a comercialização do equipamento, suporte técnico para instalação e funcionamento pleno, bem como assistência pós-venda. O projeto em questão possui valor tecnológico para usinas termoelétricas, que preveem o descomissionamento de eixos virabrequins de motores de grupos geradores após super longa vida em serviço.

Além de gerar infraestrutura pioneira de pesquisa, o projeto Saúde Estrutural de Virabrequins de Indústrias Termoelétricas, com o apoio da Eneva, proporcionou a criação do Laboratório de Fadiga de Altíssimo Ciclo, formação de grupo de pesquisa no tema e, ainda, internacionalização da pesquisa através de intercâmbios com instituições no exterior, como a TU Dortmund (Alemanha), Instituto Superior Técnico de Lisboa (Portugal) e Ritsumeikan University (Japão).

No que se refere a ensaios de fadiga de materiais estruturais, a criação de infraestrutura laboratorial com uma máquina de altíssima frequência permitirá testes em regimes super longos, isto é, no intervalo 107 – 1012 ciclos de carregamento.

Já no desenvolvimento de materiais, o equipamento de ensaios de altíssima frequência permitirá se estabelecer, de maneira mais apropriada, a relação resistência à fadiga – microestrutura após 107 ciclos. Sabe-se que em materiais de alta resistência submetidos a endurecimentos superficiais, as inclusões em posições logo abaixo da superfície atuam como sítios nucleadores de trincas em falhas no regime de gigaciclos.

Neste contexto, para desenvolver materiais com alta resistência à fadiga no regime de gigaciclos é fundamental a análise e mapeamento dos defeitos microestruturais presentes. No entanto, em virtude de dimensões de defeitos muitas vezes mínimas, suas detecções se tornam difíceis. Corpos de prova de geometria reduzida (apropriada para ensaios ultrassônicos de fadiga) e técnicas de microscopia eletrônica favorecem a indicação exata da posição de defeitos microestruturais nas superfícies de fratura, que se torna importante ferramenta de controle de qualidade do material, no que tange abordagens qualitativas e quantitativas da existência de inclusões no material.

Em resumo, no desenvolvimento de materiais de alta resistência à fadiga, ensaios em regime de altíssimo número de ciclos permitirão mapear sítios de nucleação das trincas e correlacionar com aspectos microestruturais, estabelecer a influência de descontinuidades (inclusões e poros) subsuperficiais e/ou internas, determinar o efeito do tamanho, fração volumétrica e morfologia de inclusões e, ainda, associar mudanças na iniciação de trincas com números de ciclos do carregamento.

Sobre o LABFADAC


O Laboratório de Fadiga de Altíssimo Ciclo (LABFADAC) do Departamento de Engenharia Química e de Materiais da PUC-Rio desenvolve pesquisas científicas e tecnológicas em materiais selecionados para aplicações em regimes de longa ou super longa vida em fadiga. O LABFADAC possui uma infraestrutura experimental que possibilita ensaios cíclicos em frequências ultrassônicas, inclusive com cargas médias diferentes de zero, reduzindo de maneira significativa o tempo de ensaio. Em breve o laboratório também irá realizar ensaios sob condições multiaxiais de carregamento.

Número de ciclos Convencional (100 Hz) Ultrassônico (20kHz)
107 ciclos 1 dia 9 minutos
109 ciclos 4 meses 14 horas
1010 ciclos 3 anos 6 dias

Além da extensão da curva S-N de materiais estruturais no regime de gigaciclos (107 – 1012 ciclos), também será possível a determinação da resistência à fadiga específica para um altíssimo número de ciclos, com o objetivo de prever possíveis falhas do material durante a vida em serviço do componente ou equipamento.

No desenvolvimento de materiais, o LABFADAC poderá contribuir para um melhor entendimento da relação resistência à fadiga – microestrutura após 107 ciclos de carregamento. No projeto de materiais com alta resistência à fadiga no regime de gigaciclos é fundamental a análise e mapeamento dos defeitos microestruturais. O uso de corpos de prova de dimensões reduzidas induz a nucleação de trincas em inclusões e poros localizados em regiões subsuperficiais e/ou internas. Em função das dimensões reduzidas das superfícies de fratura, a identificação dos sítios de nucleação de trincas por técnicas de microscopia eletrônica é consideravelmente facilitada. Consequentemente, o LABFADAC irá realizar pesquisas para mapear sítios de nucleação das trincas e correlacionar com aspectos microestruturais, tais como o tamanho, fração volumétrica e morfologia de inclusões e poros.

Também merece destaque aplicações das facilidades laboratoriais do LABFADAC no desenvolvimento de componentes fabricados por manufatura aditiva. Em relação as propriedades de fadiga destes componentes, se sabe que são fortemente influenciadas pela existência de poros microestruturais. Entretanto, o custo dos corpos de prova é o maior inconveniente para ensaios convencionais de fadiga. A tecnologia de ensaios cíclicos em frequências ultrassônicas permite o emprego de corpos de prova de dimensões reduzidas, o que reduz consideravelmente o custo dos testes, mesmo em regimes de carregamento bem estabelecidos (103 – 106 ciclos).

Equipe